
Paul McCartney, John Lennon, George Harrison e Ringo Starr tinham uma tarefa difícil após o fim dos Beatles. Afinal, os discos lançados por eles teriam sempre a sombra do quarteto mais famoso de todos os tempos e seriam, inevitavelmente, alvos de comparação – e comparar qualquer coisa com os Beatles é quase sempre uma covardia. Além do mais, a expectativa em torno dos materiais lançados seria das maiores na música. Pode-se dizer que McCartney não estava correspondendo a elas, lançando discos que apesar de conquistarem um ótimo número de vendas não estavam exatamente à altura da sua capacidade provada com os Beatles. Até que surgiu, no dia 5 de novembro de 1973, Band on the run. E eu ouso dizer que este álbum não deve muita coisa aos melhores discos dos Beatles.
Muitos problemas ocorreram no processo de gravação. O The Wings deveria contar com os cinco integrantes nos estúdios: Paul e Linda McCartney, Denny Lane, Denny Seiwell e Henry McCullough. Este último abandonou o projeto devido a divergências e cansado das exigências musicais de Paul. O baterista Denny Seiwell foi outro que pulou a barca quando foi decidido gravar o disco na Nigéria, algo que parecia bastante excêntrico e desnecessário. Os Wings, então, com três integrantes partiram para a África e logo perceberam que poderiam ter entrado numa encrenca.
Como pode-se perceber nos seguintes trechos retirados do site Whiplash: “(...) Ao chegarem em Lagos, logo perceberam quão mal planejado fora todo o projeto. Descobriram que o país estava sobre domínio militar já fazia sete anos e que soldados com metralhadoras poderiam ser encontrados em qualquer ponto da cidade. Viram um grande numero de pessoas pedindo esmola, mas o que lhe parecia mais absurdo era que muitos destes eram leprosos, andando no meio do povo. Ficaram chocados ao encontraram varias valas com esgoto a céu aberto ao lado das ruas. Rapidamente perceberem também que absolutamente nada era resolvido sem molhar a mão de alguém.
O clima de Lagos também foi motivo para desânimo. Setembro sendo véspera da estação de chuvas, o calor era insuportável e isto teve seqüelas. Certa noite Paul não conseguiu encontrar ar. Ele foi para a rua tentar respirar ar puro, mas era uma noite de calor tão abafada que ele acabou desmaiando. Linda o acudiu, apavorada pensando que ele estivesse morto. Levado a um hospital, o médico, sem encontrar motivo para alarde, apenas recomendou que Paul parasse de fumar ou pelo menos diminuísse consideravelmente o seu hábito. Em Londres, um médico concluiu que ele sofrera de um espasmo dos brônquios.”
Além de problemas territoriais, as condições dos estúdios eram bem inferiores ao que estavam acostumados na Europa – “(...) O estúdio da EMI ainda não estava completamente construído, iniciando uma caça a microfones, necessidade de molhar a mão das pessoas para acelerarem a construção da cabine à prova de som e terminar de instalar a fiação da mesa de som. O gravador do estúdio era uma velha Studer de oito canais de segunda mão, que provavelmente já vira melhores dias.” Mas é provável que todos esses problemas tenham contribuído para o sucesso do disco, já que era preciso dar o dobro para conseguir os objetivos. E talvez tenha sido mais ou menos por aí até a conclusão de todo o material na Inglaterra.
Afinal, Band on the run é absolutamente genial, um dos grandes da década de 70 – foi considerado o melhor disco do ano de 1973 e ficou um bom tempo nas paradas de sucesso. A começar pela faixa-título – reparem na capa do cd, com a banda em fuga -, uma música com melodia perfeita, que parece ter vários capítulos compilados harmoniosamente – If I ever get out of here/thought of giving it all away to a registered charity/ all I need is a pint a day if I ever get out of here”. A segunda faixa, “Jet”, acabou se consolidando como a mais famosa do álbum e é com certeza uma das mais divertidas. “Bluebird” lembra “Blackbird” do White Album e interrompe por um momento a existência das competentes guitarras no disco. Com certeza uma música agradabilíssima, assim como “Mamunia” - palavra que significa “abrigo seguro” no árabe e traz todo esse clima. “Let me roll it” talvez seja a minha preferida, um rock and roll clássico, daqueles que merecem aplausos do início ao fim, configurando-se como a faixa mais competente tecnicamente.
Retirando mais uma vez trechos da página Whiplash, a quarta faixa Mrs. Vanderbilt "oferece uma fantasia como letra. A familia Vanderbilt é uma rica e influente família americana de Nova York cuja fortuna vem da ferrovia. Foram os donos originais do Grand Central Station, do Madison Square Garden e em outros tempos, possuiam o terreno hoje conhecido como o bairro do Bronx.” A belíssima “No Words” é, dizem, uma carta para John Lennon – you say that love is everything/ and what we need the most of I wish you knew/that's just how true my love was.” Ainda temos a divertida “Helen Wheels”, que inicialmente não pertencia ao disco, com um trocadilho com “hell on wheels”, além da música “Picasso´s Last Words”, uma homenagem óbvia ao grande pintor – the grand old painter died last night/ his paintings on the wall/ before he went he bade us well/ and said goodnight to us all – e “Nineteen hundred and eight five”, que encerra o disco.
Band on the run é considerado um dos melhores discos de todos os tempos e é a maior referência da carreira pós-Beatles de Paul McCartney. Pessoalmente, eu o considero um dos meus álbuns favoritos. É uma das provas de que Paul McCartney – sem tirar os méritos do The Wings – é um dos grandes gênios da música e um dos mais carismáticos. Um verdadeiro ícone de todas as gerações.
Alexandre Rios.
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