sábado, 24 de novembro de 2007

Tropicália


A década de 60 foi marcada por um processo de grande efervescência cultural no Brasil, como em tantos outros lugares. Da Jovem Guarda às canções de protesto, do Cinema Novo às artes plásticas. Em quase todas as áreas, a política se fazia presente. Posições nacionalistas ligadas à esquerda dominavam a produção artística. Contrariando este contexto, desponta o Tropicalismo, movimento encabeçado pelos baianos Caetano Veloso e Gilberto Gil, seguidos por Gal Costa, Tom Zé, pelo grupo Os Mutantes e outros mais. Com influência dos Beatles, de Janis Joplin, Jimi Hendrix e em sintonia com Glauber Rocha, resolve-se romper bruscamente com o padrão populista da esquerda musical. Esta tinha Edu Lobo, Geraldo Vandré, Chico Buarque e Milton Nascimento como principais cânones e objetivava valorizar ao máximo a brasilidade nas formas de tocar e compor, gerando uma restrição expressiva não tolerada pela frente inovadora.

A idéia era universalizar a linguagem da MPB, incorporando elementos da cultura mundial como o rock, a psicodelia e a guitarra elétrica e formar, assim, a oposição à oposição. As composições visavam ligar um Brasil arcaico a um futurista. A estética seguia o ritmo da vanguarda: cabelos longos encaracolados e roupas escandalosamente coloridas caracterizavam os tropicalistas.

Em 1968, ano em que as tensões políticas no país atingem seu ápice, explode o disco Tropicália, de Caetano, onde se destacam Alegria, alegria, a embalada Superbacana e a faixa-título. Gil dispara com Domingo no parque, um dos maiores clássicos da música brasileira. Os Mutantes, com a psicodélica e sensacional Panis et circenses.

O confronto entre nacionalistas e tropicalistas se intensificava, em jornais e festivais de música. E então, vem à tona o fatídico III FIC, Festival Internacional da Canção, promovido pela Rede Globo. Com roupas futuristas de plástico, Caetano e Os Mutantes tomam o palco para apresentar É proibido proibir. A música foi recebida com uma vaia avassaladora. Tomates, ovos e pedaços de madeira voavam contra o palco. Caetano rebolava, em uma dança que simulava uma relação sexual. A platéia, escandalizada, deu as costas para o palco. Prontamente, os Mutantes reagiram. Sem parar de tocar, viraram as costas para o público. Dias depois, Gil apresenta Questão de ordem. Novas vaias, e a música termina desclassificada.

Na noite da eliminatória paulista, que levaria os ganhadores às finais no Maracanãzinho, o auditório estava lotado e as torcidas se provocavam. Geraldo Vandré apresenta Pra não dizer que falei das flores, apenas com um violão, e é aclamado pelo público. Os tropicalistas, minoritários, vaiavam. Chega a vez de Caetano e dos Mutantes, que na metade da música já não conseguiam cantar por conta das vaias. Caetano, furioso, interrompe a apresentação e faz um longo discurso alavancado pela frase: “Vocês não estão entendendo nada!”. Gil entra no palco, a vaia aumenta e a situação se torna insustentável. Caetano decide, então, retirar É proibido proibir da disputa e seguir outros rumos.

No fim do ano, ocorre o festival da Record, já não despertando tanta polêmica e tendo como maior impacto a canção Divino Maravilhoso, de Gil e Caetano, interpretada por Gal Costa, acompanhada de uma banda de rock, que se tornou título de um programa comandado por seus compositores na extinta TV Tupi. No programa, a provocação tropicalista foi ainda mais radicalizada, onde Caetano, enjaulado, arrebentava grades enquanto cantava Um leão está solto nas ruas, de Roberto Carlos ou Gil representava Jesus Cristo numa versão tropicalista da última ceia, com apóstolos cantando, comendo e jogando bananas e abacaxis para o público.

O AI-5, que estabelecia repressão pesada, foi decretado no início de dezembro. Caetano, no último Divino Maravilhoso, cantava Boas Festas, de Assis Valente, com um revólver apontado para a cabeça. Foi preso logo após o natal, juntamente com Gil. E o movimento acaba reprimido pelo governo militar, mas um forte legado permanece não só na música como em toda a cultura brasileira.


"Eu organizo o movimento, eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento no planalto central do país

Viva a bossa, viva a palhoça!"

(Caetano Veloso)

Thales Azevedo.

2 comentários:

Unknown disse...

Muito bom esse artigo! Gostei muito! O autor está de parabéns. Mas é bom ressaltar que enquanto Caetano e Gil se venderam para a mídia, há artistas que não dobram os joelhos e estam por aí botando pra arrombar, fazendo música de verdade! Artistas como Tom Zé, Rogério Skylab, Made in Brazil e muitos outros.

Unknown disse...

*** Estão... kkkkkkkkkkkk... Erro ridiculo do caralho...