quinta-feira, 31 de janeiro de 2008

Maldita inclusão digital

Estamos em pleno término de ócio e ficamos parados em frente ao computador literalmente matando tempo ( já que não temos opções variadas de lazer em nossa província cidade ). Enfim, não é sobre isso que quero falar.

Para descontrair um pouco, eu guardei um artigo da folha de São Paulo de 18 de Novembro de 2007 (Caderno Ilustrada, E7). Manchete: Celebridades enchem blogs de bobagens. A definição de blog: uma página da Web cujas atualizações (chamadas posts) são organizadas cronologicamente de forma inversa (como um diário). Até aqui todos nós sabemos disso. Entretanto, o blog se tornou um pouco mais que um “diário cor de rosa” online. Tornou-se um ferramenta fundamental para a busca por notícias específicas e alternativas. Não precisamos ficar presos a jornais ou revistas (embora, que fundamentais) já que, se bem selecionada, temos informações e opiniões variadas em variados sites.


Mas sempre tem pessoas estragando a imagem dessa maravilhosa ferramenta. Alguns artistas estão se aproveitando para fazer propaganda de si mesmo e da marca que eles “usam” (empresas pagam para famosos falar da marca no blog). Deliciem-se com tanta bobagem:



Sem contar que alguns tentam ser filósofos, bonzinhos, amigo de todos e ecologistas (está na moda). ‘¬¬


Pois é, maldita inclusão digital.

Lucas Caires

sábado, 26 de janeiro de 2008

Sempiterno


Mãe com o nome de Paulo

[A cidade de] São Paulo
(...)
matrona,
obesa,
de coração inflável,
de artérias algumas esclerosadas,
vasos linfáticos Tietê,
veias que desembocam dias intermináveis,
da labuta das suas células,
metabolismo sôfrego,
pulmões carentes de oxigenação,
mãos que amassam o barro,
pés que desbastam superfícies íngremes e generosas,
passos céleres...
Legado aos seus descendentes...

Parabéns à cidade de São Paulo, aos paulistanos autóctones e “alienígenas”!

Messias Franca de Macedo.

* Sempiterno: que não teve princípio nem há de ter fim [palavra tão densa que equivale a um texto... um tratado...]

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Dear Wendy




Solitário e pacifista por definição, Dick (Jamie Bell, do aclamado Billy Elliot) vive numa pequena cidade do Texas. Ainda pequeno, vai a uma loja de brinquedos comprar um presente de aniversário para o neto da criada de sua casa, e se depara com uma pistola antiga, que desperta um estranho fascínio. A arma é comprada, mas acaba confinada na casa do protagonista. Uma arma de brinquedo, afinal, não era o presente ideal a ser dado por um pacifista. Os anos se passam e o pai de Dick se suicida, atirando-se da mina em que trabalhava, centro das atividades da cidade. Sua mãe havia morrido há tempos e a criada já iria se aposentar. A antiga pistola é reencontrada e levada pelo dono, que conhece um amante bélico, de sua idade, e descobre ser, na verdade, portador de um revólver de dupla ação, de 6,65 milímetros.

É assim que tudo começa em Querida Wendy, 2005, do dinamarquês Thomas Vinterberg, escrito por Lars Von Trier (Dogville). Um filme que preserva seu impacto sem muitos efeitos especiais e com um cenário reduzido a alguns quarteirões. Conduzido por uma carta de Dick para ela, para a sua pistola, para Wendy. Ao juntar-se com seu novo amigo, o protagonista decide recrutar jovens solitários e inseguros, como ele, e fundar um obscuro grupo de pacifistas armados, denominado Os Dandies. As regras eram simples. Todos teriam armas, e as carregariam consigo em qualquer circunstância. Desta forma, estariam protegidos e completos. Mas nunca poderiam sacá-las à luz do sol, capaz de despertá-las para seu instinto natural: matar, ou, no vocabulário deles, amar. Cada arma teria seu nome e manteria ligações íntimas com seu portador. Durante as reuniões do grupo, na mina, os dandies estudavam tudo que fosse relacionado à cultura bélica e, lá mesmo, com uma determinação quase doentia, treinavam suas miras.

Conflitos internos surgem com o tempo e Dick acaba se afastando de sua Wendy, trocando-a por outra pistola. O grupo, então, resolve sair da teoria e partir para uma missão fora da mina, numa mistura de heroísmo e auto-afirmação, pretendendo, ainda, não romper as regras estabelecidas inicialmente. À primeira vista,
Querida Wendy pode parecer um filme estranho. Mas é repleto de entrelinhas. Com boas atuações, uma narrativa envolvente, um figurino interessante e uma trilha sonora maravilhosa – composta, basicamente, pelo conjunto britânico de rock and roll, dos anos 60, The Zombies (que recomendo bastante a quem gosta do estilo, dando destaque para o álbum psicodélico Odessey and Oracle), é um dos pontos altos da carreira do diretor.

Thales Azevedo.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

"Ateu, graças a Deus!" [Ruy Castro]


Pouca ciência afasta de Deus. Muita, a ele reconduz.

(Louis Pasteur)

Indagado por Napoleão sobre o papel reservado a Deus em seu modo de entender o Universo, o astrônomo, físico e matemático Pierre Simon Laplace teria respondido: "Não necessito dessa hipótese."

Em 1970, Jacques Monod, prêmio Nobel de biologia, reafirmava a separação radical entre Deus e a ciência: "Finalmente, o homem sabe que está sozinho na imensidão indiferente do Universo, no qual emergiu por acaso."

(...)

Por que existe alguma coisa ao invés de nada?

O que é realidade?... O real é uma idéia pura; portanto, não tem, no sentido estrito, qualquer substrato material: só podemos ter como garantida a existência de nossos pensamentos e de nossas percepções.

Segundo o filósofo Jean Guitton, Deus não é da ordem da demonstração, mas um ponto de apoio científico às concepções propostas pela religião.

Tudo o que conhecemos encontra sua origem num oceano infinito de energia que tem a aparência do nada.

O universo é um vasto pensamento. Em cada partícula, átomo, célula, vive e atue, incógnita, uma onipresença.

... Portanto, o que chamamos de realidade não é outra coisa senão uma sucessão de descontinuidades, flutuações, contrastes e acidentes de terreno que, em seu conjunto, constituem uma rede de informações.

No fundo, nada do que podemos perceber é verdadeiramente "real", no sentido que damos habitualmente a esta palavra. De certa maneira, estamos mergulhados no âmago de uma ilusão, que estende à nossa volta um cortejo de aparências e engodos que identificamos com a realidade...

Deus é pensamento (in)cognoscível(?) ... E inatingível aos nossos sentidos...

Sugestões de leitura: Deus e a Ciência, Jean Guitton e os irmãos Bogdanov;

A Mitologia do Kaos, Jorge Mautner

Messias Macedo.

Lost - Jacob Loves You



Um avião cai numa ilha deserta. 42 pessoas sobrevivem ao acidente e começa a luta pela sobrevivência. Parece mais uma filme trash da década de 70. Entretanto essa é foi a base para a criação da série mais com elogiada, conceituada, emocionante e inteligente do momento: “Lost”.

Todos estão cansados de saber que eu sou um fã assíduo de Lost, entretanto não tão doido como alguns que se tatuam em homenagem à série. Loucuras à parte quero demonstrar um pouco da emoção que é assistir este seriado e mostrar as vantagens de ver um seriado e não uma novela. Como disse anteriormente, a primeira cena mostra a queda do avião. Um pouco antes desta cena vemos um personagem, teoricamente principal, acordar no meio de um floresta tropical após uma queda de avião; Ele corre ao encontro dos tripulantes e encontra pessoas machucadas e assustadas em meio às ferragens do avião 815 da Oceanic (empresa fictícia de aviação). Cena Inicial (enjoy it). E assim começa o espetáculo.



E então, caro leitor, você me pergunta: qual a vantagem de assistir um seriado se eu tenho novelas todos os dias da semana?

Com um bom seriado o telespectador fica muito mais “viciado”. A cada semana temos um episódio que completa gradativamente algo à história. Por exemplo: muitas vezes (como em novelas) as cenas são cortadas no meio para gerar uma expectativa para o próximo episódio. Entretanto, eles não começam diretamente da última cena. Eles mostram a história com o ângulo em outros personagens. Além disso, o seriado não ganha na quantidade de informações fornecidas, mas sim na qualidade da história. Em Lost há toda uma preparação ao que vai acontecer em outros episódios.

E você me pergunta de novo: as novelas brasileiras também são bem trabalhadas. Para que assistir um seriado?

Em termos técnicos, as novelas brasileiras são bem feitas. Mas descarrega um monte de informações desnecessárias ao telespectador. Cenas completamente inúteis. Num seriado, os diretores e autores têm 45 minutos para prender o indivíduo e formar um história extremamente complexa. Além do mais, eles possuem quase 3 semanas para filmar e editar um episódio (isso que eu chamo de trabalho bem feito). Nós vemos constantemente efeitos visuais em Lost. Urso polar aparecendo no meio da floresta tropical, gente sendo sugada pela turbina do avião, avião se partindo e caindo do céu, etc.


Em novelas os personagens são totalmente planos, sem construção psicológica e , inevitavelmente, com visões maniqueístas (em nenhuma novela personagens desaparecem ou morrem do nada, como acontece em Lost). Lost começou a usar uma técnica, mais utilizada no cinema, em que não temos personagens principais. Aparentemente Jack, o médico, é o líder do grupo de 42 pessoas. Entretanto, os conflitos intra - personagem e inter - personagens tiram a liderança dele. Sem contar que constantemente a mesma história é contada de outro ângulo.

E porque tantos “idiotas” ficam criando teorias sobre uma ilha que tem torre de rádio, gravações de 16 anos e raptadores de criancinhas?

Essa pergunta é feita por pessoas que pegam episódio separados da trama. Lost põe na cabeça do telespectador uma série de perguntas (no momento sem respostas) que prende a atenção do indivíduo. O mistério gerado pelo seriado é tremendo. Também não é para menos. Urso polar aparecendo no meio de floresta... Construções, parecendo bunkers da segunda guerra, no meio de floresta... =S
O seriado dá espaço para diversas interpretações e nem tão cedo os autores vão responder as diversas perguntas que são feitas à cada temporada, pois esta é a graça do seriado.

Outra chave do sucesso de Lost são os flashbacks. Todos os episódio contam um pouco da história do personagem – foco do episódio. E como se isso não bastasse, os personagens se encontram no passado de forma inexplicável, só que não lembram dos míseros segundos de contato. E como se isso não bastasse [2], ainda criaram o flashfoward (flashes do futuro), questionando assim o destino e as escolhas tomadas pelos personagens.

Afinal, quem é Jacob?

Eu teria que explicar todas as temporadas para chegar à essa resposta. Só foi um toque para quem já conhece o seriado. Cada temporada tem um foco. A primeira é a base para construção dos personagens. A segunda tem o foco em outros sobreviventes do vôo. E a terceira nos “outros”, um povo aparentemente nativo da ilha. E a quarta (lançamento em 31 de Janeiro) ... é melhor não contar.

Quem lê esse resumo pensa que a série só fala loucura e baboseiras. Temas como destino, paixão, responsabilidade, fé, confiança ao próximo, coletivismo, perdão, entre outros, são temas tratados em cada episódio. Além de termos toques de filosofia, ciência, psicologia e livros.

Lost procura aliar entretenimento com informação. Temos 8 nomes com referência a filósofos: Rousseau, John Locke, Hume Desmond, Bakunin Mikhail, Edmund Burke, Anthony Cooper, Edward Said, Thomas Carlyle. Os autores unem a história real dos filósofos com as temáticas usadas nos episódios. Além disso, a maioria desses filósofos são iluministas, ou seja, ajudaram na criação teórica dos princípios da república (democracia). E os conflitos entre os personagens mostram claramente a busca constante da igualdade de decisões (como eu disse, o lider é apenas representativo).

Terminando, como se isso tudo não bastasse [3], a emissora abc financia a criação de um jogo chamado arg. Neste jogo cria-se uma história que tem conexões com o seriado. No ano passado criaram um chamado "Lost Experience", em que mostrou mais sobre a empresa que financiava a Dharma Iniciative ( só quem conhece o seriado sabe do que eu estou falando). Agora, o "Find 815" mostra a história de um TI da Oceanic que está tentando achar pistas sobre o avião, pois a empresa desistiu de buscar o avião. E o mais interessante é que as histórias vão bater com a história do seriado.



Não é perda de tempo assistir Lost. um entretenimento criativo e enriquecedor, algo muito difícil de se achar no âmbito nacional e internacional. E para os fãs, o melhor blog sobre Lost: Dude we are Lost

Lucas Caires.

Meu cachorro e o papa

Um cachorro não tem muitos privilégios, mas um deles consiste no seguinte: em seu caso, a eutanásia não é proibida por lei. A frase é de Milan Kundera, no final do romance A Insustentável Leveza do Ser. O cachorro do protagonista sofre de câncer. Arrasta uma pata. Fica jogado num canto. Geme de dor. Até o dia em que o protagonista o sacrifica. Na semana passada, aconteceu a mesma coisa comigo. Meu cachorro estava com câncer. Doente terminal. Segundo o veterinário, restava-lhe, no máximo, um mês de vida. Quando começou a vomitar, a arrastar a pata e a gemer de dor, decidimos sacrificá-lo. Um dia antes da data marcada ele morreu por conta própria. Foi um alívio não ter de matá-lo. Mas também teria sido um alívio matá-lo, poupando-o de um sofrimento inútil. Seu nome era "Tatu". Agora eu ando pela cidade e desato a chorar toda vez que passo por uma de suas ruas preferidas.

A eutanásia é um desses assuntos de competência exclusivamente civil a respeito do qual a Igreja Católica se sente no direito de interferir. Não é o único. Tem também o divórcio, o aborto, as drogas leves, a fecundação artificial, a pena de morte. [...] Para o resto de nós, a palavra do papa pode ter um grande peso moral, mas só vale dentro da Igreja, servindo para guiar o comportamento individual de seus fiéis. [...] Quanto mais a política se desmoraliza, mais a Igreja ocupa espaços que não lhe competem. Não digo que vamos virar um Afeganistão. Mas, se a Igreja pudesse proibir contraceptivos, censurar a TV, cercear pesquisas científicas e controlar a maneira como nos vestimos, certamente o faria. Assim como faz de tudo para impedir a eutanásia. Eu gostaria de decidir como vou morrer. Gostaria de ter os mesmos direitos do meu cachorro. Um beijo no focinho do "Tatu".


(Diogo Mainardi - 06/09/2000)

Thales Azevedo.

A religião faz mal ao mundo

O filósofo Sam Harris, um dos ateus mais barulhentos dos EUA, diz que só com o fim da fé se poderá erguer uma civilização global.

Dependendo do ângulo em que é observado, o filósofo americano Sam Harris, de 40 anos, exibe uma desconcertante semelhança física com o ator Ben Stiller, mas seu trabalho nunca está para comédias. Junto com o biólogo inglês Richard Dawkins, autor de Deus, um Delírio, Sam Harris é um dos mais ativos militantes contra as religiões. Em 2005, nos Estados Unidos, ele lançou O Fim da Fé e ficou mais de trinta semanas na lista dos mais vendidos do jornal The New York Times. Neste ano, produziu um novo best-seller com críticas à religião. Com 91 páginas, Carta a uma Nação Cristã, já lançado no Brasil pela Companhia das Letras, é um compêndio em defesa do ateísmo. É redigido com uma linguagem tão cortante e argumentos tão implacáveis que, por vezes, roça o panfletário, mas dá seu recado com clareza absoluta. O filósofo bate em cada um dos pilares da fé e conclui: "A religião agrava e exacerba os conflitos humanos muito mais do que o tribalismo, o racismo ou a política". Ele deu a seguinte entrevista:

O movimento dos ateus é forte nos Estados Unidos e na Inglaterra, principalmente. É uma decorrência dos atentados de 11 de setembro de 2001?

Vejo dois motivos simultâneos para essa confluência geográfica: os atentados de 11 de setembro e a escancarada religiosidade do governo de George W. Bush. A conjunção desses dois fatores levou muitas pessoas a se preocupar com o fato de que a fé está agora dos dois lados do balcão. Esse é um jogo altamente perigoso.

Por quê?

A fé é, intrinsecamente, um elemento que, em vez de unir, divide. A única coisa que leva os seres humanos a cooperar uns com os outros de modo desprendido é nossa prontidão para termos nossas crenças e comportamentos modificados pela via do diálogo. A fé interdita o diálogo, faz com que as crenças de uma pessoa se tornem impermeáveis a novos argumentos, novas evidências. A fé até pode ser benigna no nível pessoal. Mas, no plano coletivo, quando se trata de governos capazes de fazer guerras ou desenvolver políticas públicas, a fé é um desastre absoluto.

O senhor acha que o mundo seria melhor sem religião, sem fé, sem crença em Deus?

Seria melhor se não houvesse mentiras. A religião é construída, e num grau notável, sobre mentiras. Não me refiro aos espetáculos de hipocrisia, como quando um pastor evangélico é flagrado com um garoto de programa ou metanfetamina, ou ambos. Refiro-me à falência sistemática da maioria dos crentes em admitir que as alegações básicas para sua fé são profundamente suspeitas. É mamãe dizendo que vovó morreu e foi para o céu, mas mamãe não sabe. A verdade é que mamãe está mentindo, para si própria e para seus filhos, e a maioria de nós encara tal comportamento como se fosse perfeitamente normal. Em vez de ensinarmos as crianças a lidar com o sofrimento e ser felizes apesar da realidade da morte, optamos por alimentar seu poder de se iludir e se enganar.

É possível conciliar ciência e religião?

A diferença entre ciência e religião é a diferença entre ter bons ou maus motivos para acreditar nas hipóteses sobre o mundo. Se houvesse boas razões para crer que Jesus nasceu de uma virgem ou que voltará à Terra, tais proposições fariam parte de nossa visão racional e científica do mundo. Mas, como não há boas razões para acreditar nisso, quem o faz está em franco conflito com a ciência. É claro que as pessoas sempre acham um modo de mentir para elas mesmas e para os outros. A estratégia, nesse caso, é dizer que tal crença decorre da fé. Com freqüência, ouvimos dizer que não há conflito entre razão e fé. É o mesmo que dizer que não há conflito entre fingir saber e realmente saber. Ou que não há conflito entre auto-engano e honestidade intelectual.

Haverá o dia em que a humanidade deixará de ter fé ou a fé faz parte da natureza humana?

O desejo de compreender o que se passa no mundo é inato, assim como o desejo de ser feliz, de estar cercado por pessoas que amamos ou o desejo de ser mais feliz, mais carinhoso, mais ético no futuro. Mas nada disso nos obriga a mentir para nós mesmos, ou para nossos filhos, a respeito da natureza do universo. É claro que nossa compreensão do universo é incompleta e desconhecemos a extensão exata de nossa ignorância. Não temos como antecipar as maravilhosas descobertas que serão feitas. O que sabemos com absoluta certeza, aqui e agora, é que nem a Bíblia nem o Corão trazem nossa melhor compreensão do universo.

Mas nem a Bíblia nem o Corão se pretendem um manual científico para entender o mundo?

Esses livros não são sequer um guia sobre moralidade que possamos considerar minimamente adequado, e falo de moralidade porque é um campo em que ambos se consideram exemplares. A Bíblia e o Corão, por exemplo, aceitam a escravidão. Qualquer um que os considere guias morais deve ser a favor da escravidão. Não há uma única linha no Novo Testamento que denuncie a iniqüidade da escravidão. São Paulo até aconselha aos escravos que sirvam bem aos seus senhores e sirvam especialmente bem aos seus senhores cristãos. É desnecessário dizer que a Bíblia e o Corão, além de não servir como guias em termos de moralidade, também não são autoridade em física, astronomia ou economia.

Que tipo de impacto seu livro pode ter sobre os leitores religiosos?

Eu ficaria feliz se o livro levasse os leitores a se perguntar por que, em pleno século XXI, ainda aplaudimos pessoas que fingem saber o que elas manifestamente não sabem nem podem saber. Não há uma única pessoa viva que saiba se Jesus era filho de Deus ou se nasceu de uma virgem. Na verdade, não há uma pessoa viva que saiba se o Jesus histórico tinha barba. No entanto, em muitos países é uma necessidade política simular que sabemos coisas sobre Deus, sobre Jesus, sobre a origem divina da Bíblia. Imagino que qualquer pessoa religiosa que leia Carta a uma Nação Cristã com a cabeça aberta descobrirá que os argumentos usados contra a fé religiosa são absolutamente irrespondíveis. Isso deve ter algum efeito sobre o modo de ver o mundo dos leitores. Eles certamente vão perceber que ser um cristão devotado faz tanto sentido quanto ser um muçulmano devotado, que, por sua vez, é tão lógico quanto ser um adorador de Poseidon, o deus do mar na Grécia antiga. É hora de falarmos sobre a felicidade humana e nossa disponibilidade para experiências espirituais na linguagem da ciência do século XXI, deixando a mitologia para trás.

O Brasil é um país aparentemente tolerante com as diferentes religiões e conhecido pelo sincretismo religioso. Num país assim, é mais fácil ou mais difícil para o ateísmo crescer?

Em certo sentido, deve ser mais fácil. O convívio intenso de crenças inconciliáveis deve levar as pessoas a compreender que tais crenças são produtos de acidentes históricos, são contingenciais, são criadas pelo homem e, portanto, não são o que pregam ser. Judeus e cristãos não podem estar ambos certos porque o núcleo de suas crenças é contraditório. Na verdade, eles estão equivocados sobre muitas coisas, exatamente como estavam antes os adoradores dos deuses egípcios ou gregos. Ou os adoradores de milhares de deuses que morreram durante a longa e escura noite da superstição e da ignorância humana. Em qualquer lugar que os seres humanos façam um esforço honesto para chegar à verdade, nosso discurso transcende o sectarismo religioso. Não há física cristã, álgebra muçulmana. No futuro, não haverá nada como espiritualidade muçulmana ou ética cristã. Se há verdades espirituais ou éticas a ser descobertas, e tenho certeza de que há, elas vão transcender os acidentes culturais e as localizações geográficas. Falando honestamente, esse é o único fundamento sobre o qual podemos erguer uma civilização verdadeiramente global.

Alexandre Rios.

domingo, 13 de janeiro de 2008

Pi


9:13. Anotação pessoal.
Quando eu era criança, minha mãe disse para não olhar para o sol.
Mas quando tinha seis anos, olhei.
Os médicos não sabiam se eu voltaria a enxergar.
Fiquei apavorado, sozinho naquela escuridão.
Devagar, a luz do dia penetrou através das ataduras... e consegui ver.
Mas algo mudara dentro de mim.
Naquele dia tive minha primeira dor de cabeça.

12:45.Reitero minhas suposições.
1. A matemática é a linguagem da natureza.
2. Tudo pode ser representado e compreendido através de números.
3. Ao fazer gráficos dos números de qualquer sistema, surgem padrões. Portanto, há padrões em tudo na natureza.
Evidências: o ciclo das epidemias. O aumento e a diminuição da população de caribus.Os ciclos das manchas solares. A cheia e a baixa do Nilo.
E a bolsa de valores? O universo de números que representa a economia global. Milhões de pessoas trabalhando. Bilhões de mentes. Uma vasta rede pulsante e viva. Um organismo. Um organismo natural.
Minha hipótese: na bolsa também há um padrão. Bem na minha frente. Escondido atrás dos números. Sempre houve.

12:50. Aperto “return”.

...

São com essas frases que o filme “Pi” é introduzido. Um grande filme, dirigido pelo diretor
cult Darren Aronofsky, principalmente considerando-se o ridículo orçamento de US$ 60 mil reservados à produção.
A história tem como personagem central, o matemático Maximillian Cohen (Sean Gulette, em uma ótima paranóica atuação). Max é um gênio e tenta descobrir um padrão para a bolsa de valores, como foi dito anteriormente em sua hipótese. O desafio não é fácil. Ele desgasta Max físico e psicologicamente, resultando em delírios e fortes dores de cabeça. Nessa busca insana pela chave do padrão da bolsa de valores, Max conhece Lenny (Ben Shenkman), um judeu que acredita que existe um número no Torá que repre
senta o nome divino, um código enviado por Deus, destinado a um escolhido, uma pessoa iluminada que descobrirá o tal número. Em uma das tentativas para encontrá-lo, Max depara-se com um número de 216 dígitos que é, inicialmente, descartado, por ser considerado apenas um bug do seu computador.
Aos poucos, a vida de Max se torna mais frenética, com perseguições de uma importante firma de Wall Street, que deseja ter conhecimento do número que poderia levar conseqüências drásticas para as bolsas de valores e, conseqüentemente, a diminuição do fluxo monetário e da diversificação dos investimentos, já que a bolsa de valores é algo instável e essa instabilidade, de certa forma, é o equilíbrio para que ela funcione de maneira autônoma. Além da firma, a seita religiosa que Lenny participa passa a persegui-lo de forma mais intensa.
Max, obcecado, passa a trabalhar mais e mais. Aos poucos, o número de 216 dígitos passa a tomar uma importância que não existia antes, ela passa a ser mais do que um
bug do computador, ele pode ser o tal número.

O grande feito do filme é, justamente, a incerteza que é posta em jogo. Na verdade, não se sabe ao certo se a história toda é real ou apenas fruto da imaginação de um homem perturbado, sozinho e neurótico. Assim como a bolsa de valores é instável, a história de Max também passa a ser, cada vez mais densa. À medida que o número passa a estar mais próximo do seu conhecimento, a mente de Max se torna indomável, com verdadeiras situações surreais e simbólicas, que o levará a situações drásticas, reservadas ao final do filme.

Você, caro leitor, deve estar se perguntando, “Qual é a relação entre o número PI e o filme, afinal?“. Essa pergunta é respondida no clímax do filme, quando Max se depara novamente com o número de 216 dígitos. A câmera foca o cérebro do número, responsável pelo padrão da bolsa de valores e, talvez, tudo aquilo que exista no mundo.

Apesar de não ser uma obra-prima, realmente recomendo esse filme, de 1998. É um filme curioso, denso e enigmático e que desperta o interesse, também, daqueles que não se identificam muito com a matemática, como aquele que aqui escreve.

Só por curiosidade, na última cena do filme, Max se encontra em uma situação surreal, num parque, sentado em um banco. Lá, uma garotinha chamada Jenna, que costumava perguntar-lhe sempre equações matemáticas, para que ela pudesse ver se as respostas de Max estavam corretas na calculadora, o encontra. Max nunca errava. Eis, então, o último diálogo do filme, logo após a cena mais importante e que responde muitas perguntas, entre Jenna e Max...

- Max, olhe! Quanto é 255 vezes 183? Eu sei! Quanto é?
- Não sei. Quanto?
-46.665! Viu?
- E 748 divido por 238? Eu sei! Quanto é?


Quanto é?

Alexandre Rios.

Tv Globão


Eu assisti, há pouco tempo, as quatro partes do documentário feito pela BBC em 1993 sobre a rede Globo (Muito além do Cidadão Kane). Apesar da idade, 15 anos, o documentário é extremamente atual, quando se diz respeito à falta de decoro da Globo nesses seus anos de existência. Todos nós sabemos que a TV Globo foi fundada no regime militar, ou seja, teve sua concessão cedida pelo regime. Em pouco tempo de existência se tornou a maior do Brasil e não demorou muito para chegar à posição de maior da América Latina (daí se tira o poder de influência no senso comum do brasileiro). Entretanto, ela não fez jus a sua grandeza e atuou como um dos braços que ajudaram na permanência do regime militar. Fez isso através de exaltações ao governo e omissões de fatos importantes, como por exemplo, manifestações do movimento sindical e estudantil. O reflexo disso foi o controle da maioria da população pelo regime através da idéia de que tudo está indo bem. A desculpa que foi dada para explicar essa omissão foi a censura... Acredita nisso quem quiser.

A Globo, hoje, é um dos maiores exemplos de imprensa comercial. Pense comigo: se a Globo é financiada pelas grandes empresas você acha que ela, de alguma forma, as prejudicaria? Claro que não!! (a lógica da imprensa comercial é essa) Por isso, eu recomendo não se limitar a acompanhar apenas a imprensa comercial (Globo e Veja, por exemplo), pois, caso contrário, você será “vítima” de notícias, muitas vezes, tendenciosas e incompletas, o caso Chávez é um exemplo disso. Portanto, a meu ver, é importante procurar diversificar suas fontes de informação através de revistas e emissoras “alternativas”, já que assim, você analisa os fatos por vários pontos de vistas e...

Para finalizar, eu quero dizer que eu seria um idiota se não reconhecesse a importância da Globo não só no Brasil, mas também, no mundo todo. Ela "apenas" faz o jogo, ou seja, o problema não é só com ela, mas também com jogo.

O link no youtube do documentário: http://br.youtube.com/watch?v=JA9bPyd1RKQ

Não se esqueça que são 4 partes.

Marcos Alves