terça-feira, 28 de abril de 2009

Wonder Boys

Em tempos de Crash, O Senhor dos Anéis e Quem Quer Ser Um Milionário?, falar do Oscar, o que inclui falar mal do Oscar, perdeu, de certa forma, a graça. Woody Allen parece cada vez mais premonitório ao preferir o jazz. Não que as injustiças, incoerências e ironias sejam coisa recente. Não que boas escolhas não mais aconteçam. Mas vergonhas tamanhas em tão curto período desestimulam maiores manifestações. Anos difíceis.

A década se aproxima do fim. Saldo da Academia? Um vencedor realmente digno na categoria de melhor filme. 2005. Menina de Ouro. Saldo do cinema? Nem tudo está perdido. E é a uma pequena jóia destes primeiros anos que este texto se dedica.

Mais precisamente, de 2000. Oscar? Sim, passou por lá. Não, não com uma indicação a melhor filme. Gostaram mesmo de Gladiador. Melhor diretor? Longe. Foi a vez de Steven Soderbergh, com Traffic. Esse mesmo, pra quem filmes sobre Che Guevara nunca são suficientes. Melhor ator? Como? Russell Crowe. Gladiador... Garotos Incríveis, que tem como eixo um professor de literatura em crise, foi reduzido a uma indicação a Melhor Roteiro Adaptado, saiu como vencedor em Melhor Canção Original (Things Have Changed, Bob Dylan, vídeo abaixo – justo, muito justo, mas pouco, muito pouco) e seguiu para a resignação.

Dirigido com eficiência razoável por Curtis Hanson (de Los Angeles – Cidade Proibida, que, em 1998, sem comentários desta vez, disputou Oscar com Titanic), mostra um Michael Douglas (ele já esteve tão bem?) em dias não muito desejáveis. Abandonado pela mulher, tem problemas para terminar seu novo livro (sim, ele já teve sucesso com um livro, mas há sete anos), e descobre que a reitora da universidade onde ensina, que é casada com o chefe do seu departamento, e com quem mantém relações que vão um pouco além da boa educação, está grávida. Lógico, dele. Parece suficiente. Não é. Há uma inquilina. Sua aluna. Jovem, bonita, inteligente. Há um aluno. Introspectivo, ridicularizado, misterioso. Metódico. Gosta de cinema. E da Marilyn Monroe. Há um editor com certa atração por, digamos, excentricidades, fracassado e pressionado – o livro, o livro. Há um cachorro. Todos bastante afiados e, gradualmente, entrelaçados.

Problemas e neuroses passam, assim, a gerar mais problemas e mais neuroses. O desenvolvimento imprevisível e repentino do relacionamento com o tal aluno. Conseqüências a curto prazo. Escolhas. Rápidas. Conseqüências a longo prazo. A resistência com um desenvolvimento, digamos, excessivo do relacionamento com a tal inquilina e aluna. O que fazer com o editor? O livro. Com a ex-mulher? O que fazer com a gravidez? O que fazer com a vida? Diálogos, diálogos. Sutis, irônicos, inteligentes. Traços tão difíceis de se encontrar passando por um gênero tão banalizado e vulgar, atualmente, como é a comédia.

Garotos Incríveis começa e termina em um fim de semana. Poderia durar um mês. Leve e instigante, divertido e charmoso, com claras referências à contracultura, foi o melhor filme do primeiro ano desta década. Michael Douglas, o melhor ator. O que o leva ao aparente esquecimento? O que explica o descaso do Oscar? Resta concordar com Woody Allen. Ou, quem sabe, com Bob Dylan. People are crazy and times are strange.




Thales Azevedo.

2 comentários:

Alexandre Rios disse...

Onde os Fracos Não Têm Vez e Os Infiltrados foram outros dois filmes dignos do Oscar, em minha opinião.

Flávio disse...

Eu sei que o post é sobre cinema e, por isso a adaptação é o que conta, mas pô! Michael Chabon merecia pelo menos ter o nome citado.