segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Ascensor para o cadafalso



Não tenho dúvida de que Ascensor para o cadafalso seja um dos títulos mais apropriados do cinema – e também um dos mais belos. Neste primeiro filme do francês Louis Malle, todo um plano programado próximo à perfeição fracassa por uma questão mínima do destino, sempre ele, a colocar por água abaixo toda uma construção rebuscada, arquitetada pelos protagonistas da história.


Florence Carala (Jeanne Moreau) e seu amante Julien Tavernier (Maurice Ronet) estão decididos a assassinar o empresário das guerras e marido de Florence, Simon Carala. Não apenas para viverem juntos, mas para acabar de vez com a farsa que envolvia suas vidas, comuns nos conflitos burgueses retratados no cinema europeu na nouvelle vague. Julien concretiza a parte principal do plano mas esquece, por uma questão fatalista do destino, de um acessório que poderia levar ao crime ao patamar de assassinato – já que estava arquitetado como um suicídio. Ele retorna apressado já no fim do expediente do seu último dia de trabalho na empresa do senhor Carala para resgatar a prova. Fuma seu cigarro, já no elevador, consciente do ato e certo do seu sucesso. Tão certo que o seu carro é deixado aberto e com a chave na esquina à frente.

Mas o ascensor é desligado. Um casal de jovens, com todas as incertezas das vidas marginais que levam, com futuros não muito fáceis pela frente, roubam o carro para se divertirem, passar o tempo, aproveitar por um curto momento prazeres incomuns às suas existências. Julien Tavernier fica preso. Florence avista o carro do amante, no banco do passageiro está a moça, muito mais jovem e descompromissada – teria o seu cúmplice acovardado e fugido com outra?

Florence parece não acreditar e passa a vagar pelas ruas de Paris, por toda a madrugada, à procura de Julien, com a esperança de encontrá-lo com explicações sensatas ou para acabar de vez com o surto momentâneo e voltar para a vida burguesa que levava. Enquanto isso, os jovens rompem os limites, atingem velocidades que lhes dão a sensação de liberdade e de rebeldia que já aflorava na Europa da década de 50. Encontram um casal mais velho de alemães num motel, bem-sucedidos, conscientes do mundo e com uma visão crítica e consolidada da juventude cercada de devaneios. O jovem rapaz percebe como é uma farsa, não passa de um marginalzinho, sem futuro, sem experiência, inferior ao imponente alemão que fumava e bebia apenas o que havia de melhor, exclusivo para ricos.

A humilhação leva ao assassinato do casal alemão. O crime leva ao carro de Julien, abandonado pelos jovens que decidem infantilmente acabar com suas vidas curtas. A polícia já tem um veredicto: Julien é o responsável. Será ele condenado pelo crime que não cometeu? Simon Carala é encontrado morto na empresa. Suicídio, não resta dúvidas aos investigadores. O responsável pelo crime está sendo procurado pelo outro assassinato, e Florence observa tudo. Percebe que algo está errado e precisa de uma solução, como se não fosse ela também uma criminosa.

Neste sentido, a sensação de Florence é a de estar fazendo justiça. Afinal, parecia claro e legítimo o assassinato que ela arquitetou – já que seu marido era, antes de tudo, um fazedor de dinheiro através da guerra na Indochina Francesa. Mas no destino uma coisa leva a outra. Não fosse o primeiro crime, o que seria do segundo? Quem é mais inocente na história marginal que entrelaça pessoas completamente diferentes? Marginal em duas classes sociais distintas. Burgueses ou populares, todos são criminosos neste dia, sujeitos às penas da justiça e, principalmente, da sociedade – essa sim, a mais cruel de todos os personagens das vidas dos seres humanos.

E resta a nós, já cúmplices, observar a crueldade dos desacertos da vida, acompanhados da belíssima trilha sonora de ninguém menos que o gênio Miles Davis, composta inteira numa única noite, acompanhado de quatro outros músicos , Moreau e Malle, dividindo garrafas de champanhe no melhor estilo francês.

Alexandre Rios.

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