quinta-feira, 23 de julho de 2009

Excelsa loucura

Talvez o que eu quero com esse texto é fazer um desabafo, ou talvez apenas tentar me explicar. Nem eu sei bem ao certo. Estou em um momento em que várias convicções que eu tinha estão caindo, o que seria excelente, pois convicções são pesos a mais em uma jornada rumo à “sabedoria”, entretanto não deixam de ser perdas que incomodam, já que estamos tão acostumados a elas. Mas vamos logo ao ponto. Até recentemente, eu acreditava que transformações exteriores seriam a fórmula para a solução dos problemas da humanidade, ou seja, eu acreditava que mudanças significativas na forma em que está organizada nossa sociedade seriam suficientes. Por exemplo, um presidente com uma ideologia diferente, um sistema sócio-econômico mais “justo”, um incentivo maior ao esporte e à arte, e por aí vai. A meu ver, esse era o caminho. Contudo, eu não tinha em mente, de forma clara e madura, a idéia de que a humanidade já passou por todos, ou quase todos, os sistemas e estados imagináveis, já fomos nômades, civilizados, comunistas, capitalistas, impérios, aldeias, primitivos, avançados... Já construímos civilizações que eram pura Arte, outras totalmente voltadas para as guerras, ou para o comércio. Passamos por incontáveis situações, já tivemos inúmeras revoluções com o objetivo de evoluirmos, e, do ponto de vista tecnológico, estamos no caminho certo, não há como negar. Entretanto, sempre existiu o que Schopenhauer e a filosofia oriental denominam de “sofrimento”, em todos esses estados, em todos os patamares da evolução tecnológica humana existiu o sofrimento. A miséria, a fome, a ganância, a inveja, a alienação, a insensibilidade, as guerras, a ignorância, o apego, o egoísmo, a insensatez, a negligência, a injustiça e o culpado, tudo isso sempre existiu, e isso tudo é o que nos deixam imersos no sofrimento e na ilusão de que estamos evoluindo. Encontramo-nos em uma sociedade detentora de várias contradições e que insulta qualquer mente que tenha um mínimo de percepção. E mesmo assim, a maioria das pessoas, para não dizer todas, se deixa levar por essa corrente de superficialidade. Assim, ao acreditarem que estão no caminho certo, reúnem esperanças de um futuro próspero e justo, mobilizam-se em movimentos políticos e apegam-se a ideologias e falsas religiões, aceitando autoridades desnecessárias. Talvez, os habitantes da antiga Mesopotâmia tinham essa mesma postura e esperança há mais de 4000 mil anos atrás. Portanto, eu acredito que só loucos seriam considerados normais em um mundo como esse – conclusão que eu faço após ler o livro O Elogio da Loucura, de Erasmo de Roterdã, escrito há 500 anos. Ou seja, só um louco suportaria viver rodeado por situações nefastas, apreciar apenas prazeres transitórios pelo resto da vida, sendo refém do desejo, e não ter consciência alguma do seu estado lamentável de sofrimento, acreditando ingenuamente na felicidade. Eu não me coloco fora do grupo dos “normais”, eu estou nele, nós estamos nele. Ao nascermos, infelizmente somos sujeitos a esse determinismo milenar, no sentido contrário à lucidez. Por fim, mesmo após milênios de existência e suposta evolução, ainda compactuamos com comportamentos animais. Estamos no caminho errado, isso é irrefutável. Mas eu termino humildemente, suplicando à chamada loucura que continue a nos fazer dormir como anjinhos e, quando acordamos, espero que não nos façam lembrar dos pesadelos intermináveis que tivemos.
Marcos O. C. Alves.

Um comentário:

Thales disse...

Talvez a relação nem seja direta com a proposta principal do texto, e talvez eu até me distancie, mas por um momento faz lembrar uma das melhores cenas de um dos meus filmes favoritos desta década, As Invasões Bárbaras, em que os personagens, reunidos, refletem, com um debochado olhar distante, sobre todas as idelogias que abraçaram; o feminismo, o trotskismo, o existencialismo, o comunismo, e mais tantos outros "ismos".

A conclusão? Bem, com as experiências mais traumáticas, este é o mundo da derrocada das ideologias, das causas, dos partidos, das revoluções. Se é tudo um circo de horrores, se a humanidade pegou o bonde errado? Ainda temos a nós mesmos, aos nossos, às nossas banalidades, e, para alguns privilegiados, o senso de humor.

Sobre governos, sistemas, e toda essa gente que nos insulta diuturnamente, ficaria com a frase do Millôr, que simplesmente diz que o seu ideal político é um governo que não se meta na sua vida. Ou Don't Worry About The Government, como na música do Talking Heads. Mas esses vagabundos fazem questão de sempre chegar mais fundo no poço, e lá se vai o nosso precioso tempo...

Para terminar com uma última citação ilustre, Woody Allen diz que comédia é tragédia mais tempo. Talvez eu realmente tenha me distanciado, mas, então, e retornando, pode haver esse sofrimento irremediável, como para o seu amigo Schop. Mas que o indivíduo seja livre, e, em meio a tudo isso e ao que se chama de loucura, que haja senso de humor.