quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Depois de Horas



Depois de Horas é um filme único na carreira de Martin Scorsese. Não há nada parecido com o que o mestre aprontou neste filme de 1985, que lhe rendeu o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes. Como está escrito no pôster do filme, “Quando passa da meia-noite na cidade de Nova York, você não precisa procurar por amor, gargalhadas e problemas. Eles irão te encontrar”, as regras, como diz um dos personagens, “mudam depois de horas”. E o programador de computadores Paul Hackett sofre isso na pele quando decide sair da rotina para se divertir com uma estranha garota. Eles marcam um encontro no bairro de SoHo. Tudo seria perfeito não fossem os seguidos desacertos que tornaram a noite de Paul um verdadeiro pesadelo a partir do momento em que ele fica sem um tostão após sua única nota de vinte dólares voar pelos ares a caminho do encontro. O início ruim só piora e a Nova York que parecia promissora torna-se incrivelmente tensa, claustrofóbica, um verdadeiro labirinto do qual o protagonista não consegue escapar – afinal, ele só queria ir para casa dormir.

Apesar de ser despretensioso e funcionar muito bem como uma demonstração estilística de Scorsese, o filme vai além e mostra, quase num neo-realismo moderno, os grandes centros urbanos – ora, Nova York é a mais emblemática representante – com suas relações interpessoais, as marcas de solidão, medo, desconfiança, individualismo, as insatisfações rotineiras, paranóia e o desejo de libertação através da diversão. Tudo com um toque de humor negro absolutamente genial, que nos faz rir de nossas próprias condições nas sociedades modernas e dinâmicas. Afinal, os limites entre o prazer, a decepção e o medo se confundem nas cidades, que podem levar em pouco tempo a conquista ao trauma. Aliás, não há como esquecer a cena em que Paul Hackett ajoelha-se e questiona aos céus o porquê de tudo aquilo estar acontecendo justamente com ele, um mero programador que queria apenas sair da rotina.

A direção com o carimbo de qualidade de Martin Scorsese, a trilha sonora basicamente oitentista, o roteiro frenético, as atuações – destacando-se o carismático Griffin Dunne -, as situações absurdas, os diálogos inteligentes, os personagens curiosos e assustadores, os desencontros e Scorsese a segurar um holofote numa festa punk fazem deste filme uma sátira assustadora das sociedades contemporâneas, ou seja, um delicioso pesadelo urbano.

Alexandre Rios.

2 comentários:

Igor disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Muito boa critica...quero ver muito esse, acho q vai ser o proximo Scorça..