sábado, 15 de março de 2008

At Folsom Prison, Johnny Cash


Foi na prisão estadual de Folsom, Califórnia, que, em 13 de janeiro de 1968, Johnny Cash gravou ‘At Folsom Prison’, um dos melhores álbuns ao vivo de todos os tempos. Um clássico indispensável. O ‘Homem de Preto’ sabia interagir com seu público, geralmente composto pelos mais pobres da sociedade americana, muitos excluídos e marginalizados, livres ou presos. Cash, que já havia sido preso antes por porte de drogas, sabia como era a vida na prisão. A identificação dos presos era clara, com músicas marcadas por arrependimentos, ironias, aventuras no melhor estilo faroeste, saudade dos familiares e dos lares, falta de perspectivas, amores e, principalmente, solidão. Todos veneravam Johnny Cash, como se ele os representasse para o mundo. E representava como poucos.

O disco é, antes de tudo, humano. A forma como as músicas foram gravadas, os improvisos, as conversas com os presos, as tosses de Johnny, suas risadas, os gritos da platéia, tudo é tão honesto e real que nos faz sentir como um daqueles presidiários, aproveitando ao máximo a pouca diversão que existia na prisão de Folsom.

O disco começa com a clássica ‘Folsom Prison Blues’, primeiro sucesso de Johnny. Não havia outra música mais apropriada, a começar pelo título. Nela, Cash narra as reflexões de um encarcerado, como ele espera o tempo passar para voltar a ver o sol, como ele se tortura em saber que do lado de fora da cadeia os ricaços se divertem, fumando charutos e tomando cafés. O arrependimento é a marca principal da música, e ele dói.

"When I was just a baby my mama told me
‘Son, always be a good boy, don´t ever play with guns.’
But I shot a man in Reno just to watch him die
Now every time I hear that whistle blowing
I hang my head and cry…"

O disco continua com ‘Busted’, que retrata a miséria das famílias do interior americano, como tudo é desgastante... sustentar os filhos e a mulher parecem uma complicada tarefa, com falta de comida, remédios para gripe, vestimentas, comida, tudo isso beirando a humilhação de um pai de família.

"…So I called on my brother to ask for a loan
'Cause I was Busted
I hate to beg like a dog for a bone,
But I'm Busted

My brother said, 'there's not a thing I can do,
My wife and my kids
Are all down with the flu
And I was just thinkin' about callin' on you,
'Cause I'm Busted. "

‘Dark as the Dungeon’ é uma música linda, uma das melhores do disco, com um jeitão filosófico, que prega a união entre os trabalhadores, focando o duro labor nas minas. Trabalhar em busca de fortunas pode consumir a alma humana, deturpando a essência que devemos preservar.

"…Come all you young fellers so young and so fine
And seek not your fortune in the dark, dreary mine
It will form as a habit and seep in your soul
'Til the blood of your veins runs as black as the coal…

Where it's dark as the dungeon and damp as the dew
Where the dangers are many and the pleasures are few
Where the rain never falls and the sun never shines
It's dark as the dungeon way down in the mines"

O show continua com ‘I Still Miss Someone’, afinal os brutos também amam. Todos os corações daqueles presidiários devem ter derretido com essa música, até mesmo aqueles mais rudes, menos românticos. Todos merecem alguém, certo Johnny?

"I go out on a party
And look for a little fun
But I find a darkened corner
Because I still miss someone... "

‘Cocaine Blues’ é outra música sensacional, talvez o maior clássico de Johnny Cash. Não há outra música que os presos possam se identificar mais. O sarcasmo, a anarquia, a falta de preocupação em ofender a sociedade americana é marcante. Um assassino narra seus últimos dias antes de ir pra prisão...de Folsom, claro! Nela, o protagonista da história toma uma dose de cocaína, volta pra casa e mata sua mulher que o traía com mais cinco homens, tudo contado sem eufemismos. Quantas histórias semelhantes deviam se misturar naquele momento, quanta identificação!

"Early one mornin' while makin' the rounds
I took a shot of cocaine and I shot my woman down
I went right home and I went to bed
I stuck that lovin' 44 beneath my head…

…The judge he smiled as he picked up his ben
99 years in the Folsom pen
99 years underneath that ground
I can't forget the day I shot that bad bitch down!

Come on you've gotta listen unto me
Lay off that whiskey and let that cocaine be!"

Não é uma música politicamente correta, sem dúvidas. Estaria Johnny Cash fazendo apologia ao crime, drogas e à falta de escrúpulos na sociedade? Talvez. Na minha opinião, ela apenas retrata um fato do submundo, de forma crua, sem querer agradar ninguém. Johnny, acompanhado da banda The Tennessee Three, levam o público a delírio, mais do que merecido.

Pois bem, o disco ainda continua narrando sagas de presidiários antes de pararem em cana. ’25 Minutes to go’ é contagiante, lembra os filmes de faroeste, em fugas que devem ser rápidas. Nessa, Johnny tem 25 minutos para correr da polícia, e nós acompanhamos essa fuga através da voz rouca de Cash. ‘Send a Picture of Mother’ segue a linha da vida atrás das grades. Nela, dois irmão estão presos por sete anos. Um consegue a liberdade, o outro – no caso, quem conta a história – continua encarcerado por ter tentado fugir anteriormente. A única companhia dele vai embora e a solidão amarga ainda mais a vida daquele que ficou.

"After seven years behind these bars together
I'll miss you more than a brother when you go, when you go
If only I had not tried to escape
They'd barred me with you I know, yes I know…"

A história fica ainda mais emocionante quando o irmão pede ao outro para cuidar dos pais, ajudá-los no trabalho pesado, além de convencer todos os amigos, todos os familiares, que ele ainda vai voltar pra casa, apesar da improbabilidade disso acontecer. Diante de tanta tristeza, uma coisa pode aliviar ainda mais sua solidão: a foto de sua mãe.

"Won't you tell the folks back home I'll soon be coming
And don't let them know I never will be free be free
Sometimes write and tell me how they're doing
And send a picture of mother back to me

Say hello to Dad and shake his poor hardworking hand
And send a picture of mother if you can… "

O álbum possui 19 faixas, muito bem executadas. Em uma delas, Johnny chama sua amada, June Carter, para participar de um dueto da animada ‘Jackson’, música típica do interior americano. ‘I Got Stripes’ é um dos pontos altos do show, e todos os “listrados” acabam satisfeitos, como tinha de ser. Na última faixa, a platéia fecha o disco aos gritos, assovios e aplausos som de ‘Greystone Chapel’, o ‘Homem de Preto’ se despede e os presos voltam às suas celas, retornando à rotina, um pouco mais feliz, provavelmente.

Johnny Cash é uma lenda da música, não só do country. Afinal, ele vai além. Sua música de interior beira o rock´n´roll selvagem, com momentos melancólicos e divertidos, que possuem uma identificação impressionante com os delinqüentes, com os cidadãos do submundo, com as pessoas livres, miseráveis ou não. A coragem que ele teve de gravar um disco numa cadeia, merece todos os aplausos possíveis. A sociedade americana conservadora poderia ver com maus olhos uma possível afronta contra os bons costumes. Cash insistiu com a idéia e a gravadora teve que ceder, o que foi uma boa decisão, já que ‘At Folsom Prison’ colheu bons lucros e até hoje é lembrado por todos os amantes da boa música.

1- Folsom Prison Blues
2- Busted
3- Dark as the Dungeon
4- I Still Miss Someone
5- Cocaine Blues
6- 25 Minutes to Go
7- Orange Blossom Special
8- The Long Black Veil
9- Send a Picture of Mother
10- The Wall
11- Dirty Old Egg Sucking Dog
12- Flushed from the Bathroom of Your Heart
13- Joe Bean
14- Jackson
15- Give My Love to Rose
16- I Got Stripes
17- The Legend of John Henry's Hammer
18- Green, Green Grass of Home
19- Greystone Chapel




Alexandre Rios.

3 comentários:

Unknown disse...

Muito bom!
Esse cd do Johnny Cash é, sem dúvida, um clássico. Eu não canso de ouvir, muito legal.

Anônimo disse...

Apesar das nossas, digamos, divergências musicais, baixarei.

Tais Bichara disse...

Johnny Cash é realmente um excelente músico. Boa voz, boas músicas e perfeito envolvimento com o público. Além de gostar das músicas - o que não é tarefa difícil - sempre admirei essa atitude dele de ter feito um show, e usado este para gravação do CD, numa prisão. Não só compreendia os sentimentos daquelas pessoas como tinha respeito por eles.

"Afinal, ele vai além. Sua música de interior beira o rock´n´roll selvagem, com momentos melancólicos e divertidos"

sensacional! ;P